Há muito tempo que não digo o teu nome e talvez aches estranho que te escreva para falar do Natal, porque a verdade é que não me lembro bem das coisas - o teu cheiro, a tua voz, o teu corpo vigiando o meu desempenho enquanto fazia os TPC na cozinha depois do lanche. Não sou capaz de mais memórias que não sejam aquelas que existem nos álbuns: tu grávida do teu segundo filho, com um lenço na cabeça, tu no meu baptizado, tu numa viagem ao Portugal dos Pequeninos, tu na mesma fotografia que usaram no jornal para informar que tinhas ido embora. Não me lembro de muitas coisas, desculpa, mas entre estilhaços e sombras, há essa véspera de Natal em que ainda não tinhas -------. De noite, ouvi barulho, e por essa altura já suspeitava que eras tu quem trazia tudo o que eu precisava, não um velho cuja pança tornaria improvável a sua entrada pelo exaustor da cozinha. Pela manhã, podia ver o frio nas janelas, no lado de fora, enquanto dentro de casa, junto ao pinheiro com luzes que ao fim de uns dias tinham pifado, estava a bicla com rodinhas, acessório para inábeis que eu estava apostado em dispensar rapidamente. Estou agora longe desse Natal de pijama e pantufas e cumpro com a vontade de fugir das Boas Festas de geada para um lugar onde até o Menino Jesus anda de calções de banho. Estou longe. Mas queria dizer-te, tantos anos depois, que se estivesses por cá, eu saltaria em andamento dos alucinantes dias cariocas e apanharia um avião agora mesmo, porque é no colo dessa manhã antiga, quando tu estavas, que mais gostaria de passar o Natal
Hugo Gonçalves in "Jornal i"
12.24.2010
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