Sei que o senhor pôs os gregos mais caladinhos que os portugueses na final do Euro 2004 e sei que, se gozarmos com coisas sérias, as agências de notação baixam o rating do país para "BB, lixo, cotão que se acumula nos cantos". Os portugueses podem ser taciturnos como uma manhã de derrame petrolífero, mas também são danados para a brincadeira em momentos de desenrascanço existencial, condição que se agrava nos meses de sol e trajes menores. Não é por acaso que a nossa revolução aconteceu em Abril. O povo sai à rua, mas só se não estiver fresquinho. Não leve a mal que o aconselhe, sou de Lisboa, amo esta cidade como quero amar uma mulher. Sente-se nas esplanadas, oiça as conversas. Ainda ontem alguém dizia que tinha visto na TV um tipo da troika - UE, BCE, FMI - a entrar num táxi com uma cerveja. Fiz logo o filme todo. Em menos de uma semana, os seus homens estarão a dizer "uma imperial" sem sotaque e terá de ir buscá- -los a uma discoteca no Cais do Sodré, a uma praia da Costa, a uma varanda de Alfama, a um recanto onde se grelha peixe, se come pão e há uma sombra. Temos tantas coisas bonitas, tantas coisas pelas quais estamos dispostos a procrastinar. Sei que não é tempo de festa, mas o senhor chega com este calor, e daqui a nada é a final da Champions, depois os santos, há bailarico na Bica, e torna-se difícil para nós e para a sua equipa não ir beber umas cervejas ao fim da tarde. O que lhe quero dizer é isto: mesmo que nos arranquem uma costela para que o cinto aperte mais, somos gente que ainda vale a pena, gente que recebe bem.
Hugo Gonçalves in "Jornal i"
4.15.2011
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