Jesus era um mulato de Nazaré, no estado da Bahia, com talento de graffiter. Passou por São Paulo, trabalhou num talho em Barcelona, pintou paredes em Lisboa.
Madalena era menina de colégio católico com um pai banqueiro. Tinha um piercing no mamilo, bebia cervejas de litro nalgum miradouro com djembês e cães anorécticos, fazia voluntariado num hospício. Era tão entusiasta a ajudar os outros como era a mudar de namorado. Mas um dia Madalena conheceu Jesus.Descia a rua e um grupo de rapazes reparou nos seus calções curtos. Cuspiram piropos, brutalizaram a beleza com palavras cheias de porcaria, barraram-lhe o caminho.Jesus passava por ali, tinha uma mochila com latas de spray e uma apetência para praticar o bem pelo mundo fora.
Nas paredes das cidades escrevia: "Amarás o teu próximo como a ti mesmo", "Se a luz que há em ti está apagada, imensa é a escuridão", "O que queres que os homens façam por ti, faz igualmente por eles".Para impedir os insultos e abusos a Madalena, Jesus enfrentou os agressores, sacrificou duas costelas, partiu dois dentes, perdeu a consciência. Antes do desmaio, disse: "Que alguém lhes perdoe porque eles não sabem o que fazem".Operado de urgência, foi declarado em coma. Mas no terceiro dia abriu os olhos. Madalena foi a primeira pessoa que o viu acordado. Jesus não conseguia falar e usou as mãos para pedir um papel e uma caneta. Nele fez um dos seus desenhos. E escreveu: "A paz esteja connosco". Quem os visse naquele quarto de hospital não teria dúvidas: Jesus e Madalena poderiam ser felizes para sempre.
Hugo Gonçalves in "Jornal i"
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